História de Ovar cidade museu do azulejo, em 1892
Ovar possui sinais de ocupação remota desde a pré-história, em termos de documentação só existem notícias das suas gentes a partir do século XI. Sendo uma terra de lavradores, pescadores, comerciantes de sal e artesãos, a cidade foi crescendo e ganhando importância, tendo recebido foral por D. Manuel I, em 10 de Fevereiro de 1514. As difíceis dificuldades da vida levaram muitos pescadores vareiros a tentar a sorte pelo resto da costa portuguesa e do outro lado do Atlântico, sendo este último facto apresentado importante para entender o surgimento do fenômeno do azulejo na cidade em conjunto com o Carnaval.
“A larga maioria dos azulejos de Ovar data dos séculos XIX e XX. De realçar as ruas da zona histórica da cidade de Ovar que apresentam um conjunto fora do comum de casas com revestimentos azulejares, o qual torna-as num autêntico museu vivo do azulejo. O revestimento das fachadas com azulejo semi-industrial começou, no século XIX, por ser uma moda "importada" por emigrantes "brasileiros" enriquecidos. Os emigrantes oitocentistas, retornados do Brasil, investiram as suas poupanças em habitações com características semelhantes às que existiam no outro lado do Atlântico.
A moda "pegou" porque nos arredores do Porto e em Aveiro surgiram, entretanto, unidades industriais capazes de vender azulejo em quantidade e por baixo preço. Mas "pegou", também, porque o azulejo permite manter as fachadas das casas com um a limpo e luminoso ao mesmo tempo que protege as paredes das humidades e das variações da temperatura. Para preservar o património edificado de Ovar, nas suas várias vertentes e alertar para a importância - pela quantidade e variedade - da sua componente cerâmica, incidindo, sobretudo, no azulejo de fachada, a C.M. Ovar criou o Atelier de Conservação e Restauro do Azulejo.” Fonte: CM Ovar.
Importa comentar o facto destes emigrantes brasileiros regressados endinheirados das Américas investirem nos azulejos e trazerem também outras culturas que foram assimiladas pelos Ovarenses, sendo de destacar o Carnaval, o basquetebol e o reforço do futebol. O Estádio Marques da Silva foi oferecido à cidade por um destes emigrantes, recebendo em troca o seu nome. Neste trabalho só nós vamos debruçar sobre o azulejo, contudo é de salientar que já no guia turístico de 1959 se fazia grande referência ao Carnaval.
Rua do Azulejo - Núcleo principal dos azulejos da cidade de Ovar
A Rua do Azulejo, onde se encontra o verdadeiro núcleo da azulejaria de Ovar, fica concentrada no centro da cidade, nas Rua Dr.º José Falcão e Padre Ferrer, embora por toda a cidade e freguesias se encontre este traço característico do concelho, em monumentos religiosos, públicos e privados. Esta moda do azulejo de fachada foi trazida por imigrantes vareiros que retornaram a Ovar e trouxeram na bagagem de Manaus - Brasil esta forma de construção, as suas casas eram popularmente conhecidas como "As casas do Brasileiro". Um dos problemas que as casas de Ovar enfrentavam naquela altura era a humidade, este material além de resolver o problema, era atrativo, brilhante e bonito.
Rafael Salinas Calado, o homem que ajudou ao reconhecimento
Uma das pessoas que contribuíram para Ovar ser reconhecida como “Ovar Cidade Museu do Azulejo” foi Rafael Salinas Calado, falecido com 69 anos em 27 de Dezembro de 2006. Foi um dos maiores especialistas em cerâmica que Portugal já conheceu. Foi fundador e Diretor do Museu Nacional do Azulejo, Conservador do Museu Nacional de Arte Antiga, escreveu e colaborou em vários artigos e obras sobre cerâmica.
"Ovar é um museu vivo do azulejo – frase dita e redita, quase “slogan” – que exige, no entanto, uma clara explicação, sobretudo para dar aos vareiros, conscientemente bairristas, uma dimensão mais exata da importância nacional daquilo que têm sabido estimar e conservar e exemplarmente defender. (…) Portanto, as ruas de casinhas cobertas da cor e variedade dos motivos dos seus azulejos, expostos à privilegiada luz da Ria, fazem de Ovar um magnífico museu. Ele recria, mostra e ensina, com invulgar evidência, os verdadeiros recursos de originalidade e beleza conseguidos na coerente simplicidade de um gosto enraizadamente nacional. É uma lição de prazer estético o deixarmo-nos passear pelas praças e ruas, encharcando os olhos nas mais variadas descobertas, sempre renovadas. Fachadas de cerâmica, singelamente enriquecidas pela cor e pelo brilho a que a eloquente sabedoria popular conseguiu – à custa de um modesto material – fazer ganhar, através de enfeitiçantes reflexos, uma escala monumental. Também por isso, Ovar é – toda ela – um monumento. (…)”
Rafael Salinas Calado, 1981
Foi a partir deste pequeno texto por ele assinado que se assistiu por parte da Câmara Municipal a revalorização deste património. Este especialista estava permanentemente a ser solicitado, de norte a sul de Portugal, sempre disponível para dar a sua colaboração sobre este tipo de arte em Portugal, pelo que qualquer biografia que lhe seja feita a título póstumo pecará sempre por omissão.
Este mediatismo vindo duma entidade externa levou o poder político a olhar com outros olhos para este património e pressionando-os a agir. Os vareiros acordaram para a riqueza que tinham à sua frente e acrescentaram-no à sua identidade. A autarquia compreendeu o seu valor e depressa começou a transmitir a ideia de que este fenômeno é único e específico de Ovar, o que deixando de lado o "bairrismo salutar" não será bem assim. O importante é que levou à proteção deste património que de outro modo se iria perder.
Exposição "Azulejo Como Expressão Urbana"
Em 2001 foi realizada uma exposição sobre este tema tendo o próprio presidente da câmara realçado o facto de o azulejo servir para o reforço da identidade vareira no prefácio do livro o "Azulejo Como Expressão Urbana".
"O 'Azulejo como Expressão Urbana' foi o tema de uma exposição cujo argumento é o azulejo: o azulejo de Ovar, que embeleza e diferencia o nosso património edificado e que passou a ser muito utilizado, sobretudo, a partir do final do séc. XIX e princípio do séc. XX A maior parte dele não é um azulejo de luxo; pelo contrário, este azulejo foi popularizado como revestimento na arquitetura tradicional vareira, justamente por proprietários não endinheirados, cujo grande objetivo era a proteção das paredes das suas casas com um material duradouro, polícromo e de variadas formas geométricas. Igrejas, edifícios públicos, casas solarengas ou as muitas pequenas casas de telhados de duas águas revestidas com este azulejo, individualizam a cidade e distinguem-na num todo estético, simultaneamente belo, variado, acolhedor, admirado pelo visitante e estudado por interessados e técnicos da especialidade. É minha convicção que o azulejo em Ovar ajudou à humanização da cidade e ao reforço da identidade vareira."
Ovar, Abril 2001
O presidente da Câmara
Armando Franca. Dr.
Este fenômeno é recente conforme demonstram as pesquisas efetuadas em antigos guias turísticos desta cidade. No livro “Ovar – turística comercial e industrial, 1959, os seus autores fazem uma introdução onde valorizam o valor das gentes locais, o Presidente da edilidade vareira escreveu o prefácio, enumerando todas as obras com importância para a cidade, construídas e planejadas para o futuro, valorizando o seu património natural e construído, em nenhum local deste documento aparece qualquer referência ao azulejo.
Galeria de fotografias sobre a história do azulejo de Ovar
- Guia turístico de Ovar de 1959 Guia turístico de Ovar de 1959
- Guia turístico de Ovar de 1959 Guia turístico de Ovar de 1959
- Guia turístico de Ovar de 1959 Guia turístico de Ovar de 1959
- Guia turístico de Ovar de 1959 Guia turístico de Ovar de 1959
https://ondasdaserra.pt/index.php/ovar-concelho/ovar-conhecer/item/612-ovar-cidade-museu-do-azulejo#sigProId10a2ce253d
Quando as revistas já começam assumir o azulejo como identidade vareira
Outros das revistas mais recentes que também nada refere é “Vida Portuguesa” de Março 1984. Contudo na década de 90 do século passado começam a surgir as primeiras referências, onde o azulejo já é um cartaz da cidade. Na exposição realizada pela Câmara Municipal de Ovar em 2001, o tema foi “ Azulejo como expressão urbana”.
Um exemplo em como a edilidade assumiu plenamente esta identidade foi o facto de em 2009 a identidade corporativa da Câmara Municipal Ovar ter mudado. Este Município deixou de integrar o símbolo do mar para adotar um com influência nos azulejos da cidade.
A criação do "Atelier de Conservação e Restauro de Azulejo"
De forma a proteger este património foi criado em 2000 o Atelier de Conservação e Restauro de Azulejo, pela divisão de cultura da Câmara Municipal desta cidade, tendo como objetivo primordial a preservação do património edificado de Ovar nas suas várias vertentes e alertar para a importância da sua componente cerâmica, incidindo sobretudo no azulejo de fachada datado entre os finais do século XIX e princípios do século XX.
O Atelier disponibiliza um conjunto de serviços na área de conservação preventiva e curativa destes elementos: Apoio aos munícipes na área da recuperação de fachadas, limpezas, consolidação de estruturas e construção de réplicas. Fazem junto dos estabelecimentos de ensino locais ações de divulgação e parcerias, com o objetivo de promover este património, educando os mais novos para a sua salvaguarda futura.
Importa realçar que antes da existência deste local os munícipes não tinham como recuperar e restaurar as suas casas de forma económica e assistiu-se durante décadas à sua destruição relacionada com obras de conservação, demolições ou atos de vandalismo. Mas faltava sobretudo o sentimento que levasse as pessoas a quererem preservar este património.
Levantamento fotográfico de Ovar cidade museu do azulejo
Ovar possui na sua zona antiga, dezenas de casas onde os visitantes podem ver os azulejos de Ovar, nas suas fachadas, com traço antigo, altas portas e janelas, que apaixonaram o seu maior divulgador Rafael Salinas Calano e também o podem cativar.