Apresentação pessoal e percurso académico do biólogo Rafael Marques
O biólogo Rafael Marques vive em Canelas que é uma freguesia do concelho de Estarreja, tendo-se licenciado em biologia na Universidade de Aveiro e terminado o seu curso com um projeto nos percursos do Baixo Vouga Lagunar da BioRia neste concelho.
Depois da Licenciatura fez o Mestrado em Ecologia Aplicada e esteve seis anos a trabalhar em Lousada na gestão dos ecossistemas onde participou no projeto “Plantar Lousada”, que tem como objetivo fazer a reflorestação desta região com espécies nativas.
Rafael Marques: “A minha especialização inicial foi a botânica, mas atualmente gosto bastante do que estou a fazer na gestão dos ecossistemas naturais e do seu restauro ecológico.
Livro “Guia de Flora do Baixo Vouga Lagunar”
O percurso acadêmico de Rafael Marques culminou com a publicação em conjunto com a sua orientadora e outras colegas do “Guia de Flora do Baixo Vouga Lagunar”, onde são descritas mais de 270 espécies de plantas desta região, comuns a outras zonas do país e mencionados alguns endemismos regionais.
O livro está organizado pelas cores das diferentes plantas, podendo ser adquirido na Biblioteca de Estarreja. Em cada secção existe ainda uma área para descrever as curiosidades das plantas e os seus usos e costumes.
Este manual foi utilizado durante a visita guiada para identificar as espécies que foram sendo encontradas pelo caminho.
A participação do biólogo Rafael Marques nos projetos do município de Estarreja
Rafael Marques: “No ano 2022, vim colaborar com o município de Estarreja num projeto muito ambicioso do executivo que pretende reformular a forma como se trata o ambiente nesta região e iniciar projetos de conservação da natureza. Já criaram felizmente um há muito tempo que foi o BioRia, que fez sucesso nesta região e agora querem aumentar ainda mais a sua área e focos de atuação, num eixo muito importante que é a conservação da natureza, o restauro ecológico e o controle das espécies invasoras.”
Associação BioLiving – Frossos – Albergaria-a-Velha
Rafael Marques é um dos membros fundadores da Associação BioLiving, que nasceu oficialmente em julho de 2016, estando localizada em Frossos, Albergaria-a-Velha e realizando os seus projetos num terreno de Canelas, onde estão a fazer o seu restauro ecológico e proteção de algumas espécies.
O projeto da Associação BioLiving protege a salamandra lusitânica
Foto: Parque Biológico de Gaia
Rafael Marques: “Eu nasci em Canelas, onde a minha família tem um terreno com uma nascente de água, um carvalhal e um campo de milho, que foi transformado num bosque nativo misto, onde são protegidas cerca de 12 ou 16 espécies.
Em 2016, quando eu já estava na universidade, entrei num projeto onde fizemos várias saídas a este terreno onde acabamos por descobrir um núcleo da espécie protegida salamandra lusitânica, que só existe no noroeste da península ibérica. Há cerca de um mês identificamos um sítio onde ela também existe em Avanca.
Eu faço parte da equipa de coordenação do Projeto Lusitânica, que tem este nome porque além de sermos lusitanos a espécie chama-se Chioglossa lusitânica ou salamandra lusitânica. O seu objetivo é proteger o habitat e a vegetação envolvente para proteger este animal.”
O projeto da Associação BioLiving protege a vaca-loura
Rafael Marques: “Neste terreno foi também encontrado no núcleo de carvalhos o inseto vaca-loura que é um escaravelho com cornos, protegido na União Europeia.”
A visita guiada a duas ribeiras da Ria de Aveiro em Estarreja
A visita guiada a duas ribeiras da Ria de Aveiro foi conduzida por este biólogo, tendo decorrido no dia 26 de junho 2023, durante o evento “Descobrir e Experienciar a Ria”, organizado pela Câmara Municipal de Estarreja. A mesma desenvolveu-se numa pequena caminhada entre a Ribeira do Mourão – Avanca e Ribeira do Telhadouro – Pardilhó e teve como objetivo a exploração dos sapais destas zonas ribeirinhas, de forma a ser conhecida a sua biodiversidade, fauna e flora e importância da diversidade destes ambientes de transição tão típicos da paisagem lagunar da Ria de Aveiro.
Ribeira do Mourão - Avanca - Ria de Aveiro
A Ribeira do Mourão em Avanca integra a Rede Natura 2000
Rafael Marques, começou por explicar que a Ribeira do Mourão, pertence à freguesia de Avanca e integra a Rede Natura 2000. O mesmo frisou que a sua pequena dimensão é inversamente proporcional à sua importância, por ser a única de Avanca a ter um habitat composto por caniçal onde nidificam duas importantes espécies da Ria de Aveiro, a garça-vermelha e a águia-sapeira, sendo uma das razões fundamentais para a importância da sua preservação.
Em muitas destas ribeiras é possível ver antigas estacas em madeira junto às margens que tinham o objetivo de fixar as terras e não haver derrocadas e assorear os canais, impedindo depois os barcos de navegar.
A Ria de Aveiro é um habitat para muitas espécies de garças
Rafael Marques explicou que na Ria de Aveiro existem muitos tipos de garças, que podem ser observadas nestas ribeiras visitadas, das cores vermelha, cinzenta e duas de cor branca, a pequena e a grande. A pequena garça boieira tem a cor branca, sendo muitas vezes encontrada junto das vacas e dos bois e viajando por vezes à boleia no seu dorso, no que pode ser chamado de "Uber animal".
Os sapais da Ribeira do Mourão são de água salobra
Rafael Marques: “A Ribeira do Mourão é um habitat que está sob a influência das marés, na maré baixa a água que corre de jusante é doce, sendo proveniente dos rios que descem da montanha e que vão desaguar na ria. Vamos por esta razão ter sempre aqui ao longo do dia uma água salobra, onde a salinidade é muito variável e nunca vai ser igual à do nível do mar, possibilitando a presença deste tipo de plantas do sapal.”
O sapal está adaptado às zonas salgadas
Rafael Marques: “O sapal é uma formação vegetal halófita adaptada às zonas salgadas, que se origina em zonas costeiras de águas calmas. O reduzido fluxo das marés facilita a deposição dos detritos e sedimentos em suspensão fazendo surgir bancos de vasa favoráveis à instalação dessa vegetação particular. Cada uma das três zonas do sapal é colonizada por espécies distintas, sendo influenciadas pela variação da salinidade, período de submersão, sedimentação e arejamento do solo.”
O sapal oferece proteção contra as alterações climáticas e subida das águas
Rafael Marques: “O sapal funciona como as dunas no mar, sendo proteções naturais contra o avanço das águas. Nós ao andarmos a perder o sapal, também estamos por assim dizer a perder território útil, porque a ria vai avançando com o aumento do nível do mar e quando mais for saudável, mais resistência vai ter. Por esta razão devem ser tomadas medidas para a sua proteção, felizmente ainda temos zonas muito boas aqui em Pardilhó, mas algumas deveriam ser recuperadas.
Este é um caminho que se tem de fazer e já anda a ser estudado nas universidades para se escolherem as melhores estratégias e dinâmicas para o proteger, por isso é de extrema importância mapear o que temos, para depois sabermos as medidas adequadas para a sua preservação. “
Os três tipos de sapais, alto, médio e baixo
Rafael Marques: “Existem três tipos de sapais, alto, intermédio e baixo, na Ribeira do Mourão temos uma zona de sapal alto com plantas mais altas do tipo junco, sarcocornia, que é muito parecida com a salicórnia e depois no sapal intermédio a salicórnia.
A salicórnia caracteriza-se por se instalar em zonas muito perturbadas e que estão muito tempo submersas, por isso todos os arbustos e plantas que necessitem de um solo menos submerso não se conseguem instalar porque as folhas ficam cobertas pela maré não conseguindo respirar e fazer a fotossíntese.
É entre o sapal alto e intermédio que muitas espécies encontram proteção, como sejam as de maior porte e também os passeriformes.”
Flora do sapal baixo
Rafael Marques: “Em relação à flora no solo mais sujeito a marés, o sapal baixo a colonização tem como pioneira, a gramínea murraça, serpatina marítima, que suporta longos períodos de submersão e que por isso mesmo se instala nas zonas de mais baixa cota onde forma vastos prados de cor verde-escura no meio da água.”
Flora do sapal médio
Rafael Marques: “Ao sapal baixo segue-se o sapal médio com predomínio de espécies subarbustivas como a gramata e gramata-branca e que frequentemente surgem a verdejar as valas, esteiros e linhas de drenagem. Entre estas plantas surgem as espécies herbáceas como o malmequer-da-praia ou dos sapais, a campana-da-praia o sapinho-das-areias, a erva-do-brejo, botões-de-latão, que é uma espécie invasora, o triângulo, que é um junco diferente e o limónio.”
Flora do sapal alto
Rafael Marques: “No sapal alto as espécies anteriores vão sendo gradualmente substituídas pelo junco das esteiras ou junco marítimo que aparecem em grandes extensões atribuindo-se neste caso a designação de juncal.
Nesta região os juncais são também conhecidos por praias de junco. Esta espécie tem sido muito utilizada pelas populações ribeirinhas para fazer as camas de gado e cobrir os montes de sal, depois de degrada na cama do gado podem ser ainda valorizadas como fertilizante agrícola.”
Uma das visitantes assinalou as centenas de caranguejos nas águas
Rafael Marques: “Estas zonas de sapal são extraordinárias para a alimentação de crustáceos, microcrustáceos, peixes, aves, sendo um autêntico berçário para estes animais. Como é uma zona de abrigo, há muita bicharada que se esconde ali no meio e os animais vêm aqui para se alimentar.”
Os caniçais funcionam como depuradores limpando as águas da poluição
Rafael Marques: “Este sapal também está a desempenhar um serviço muito importante para nós, porque os caniços são depuradores da água fazendo a despoluição da água e retendo metais pesados e outros poluentes nas suas raízes, sendo muito utilizado em tanques das ETARs, para fazer uma primeira descontaminação. Muitas vezes comete-se o erro de chegar a estes locais e abrir caminhos, fazer “limpezas” ou dragagens e colocar os lodos da ria para cima dos sapais destruindo-os.”
Reconhecer o milhafre e a águia pelas formas diferentes da cauda
Durante a visita surgiu no céu a voar em círculos perscrutando o horizonte um milhafre, que o biólogo nos disse que é uma espécie que passa o verão na ria e caça nos caniçais, podendo ser identificado pela sua cauda com o formato do rabo do bacalhau enquanto a da águia tem o formato de um leque aberto. Os núcleos de eucaliptos muito altos, que não são muito bons para a natureza são usados por esta ave para nidificar.
A gramata-branca é uma planta comestível com sabor salgado
Rafael Marques assinalou o local onde neste sapal cresce a gramata-branca, cujas folhas têm parecenças com o louro. Este arbusto pode ser consumido em saladas em virtude de ter um agradável sabor salgado parecido ao tremoço. Os participantes aproveitaram para provar esta planta que tem algumas semelhanças com o sabor da salicórnia.
Salicórnia espécie pioneira conhecida como o sal verde
A salicórnia cresce em espaços húmidos junto da ria e que não tenham ervas nem arbustos, como o junco ou a gramata-branca. Esta planta perde por competição para outras espécies que depois do seu desenvolvimento venham a crescer no local. Esta espécie é pioneira de zonas perturbadas pelo homem ou força natural, porque por vezes há pequenas derrocadas de terra sapal, que são aproveitadas pelas espécies pioneiras para ganharem espaço para crescerem, depois acabam por ser substituídas por outras plantas.
As diferenças da gramata-branca e da salicórnia
A gramata-branca tem o sabor salgado porque cresce em água salobra e absorve o sal e como o caniço são depuradoras das águas, podendo os metais pesados e os poluentes subirem e por esta razão só as folhas da parte superior devem ser consumidas.
Este arbusto pode durar vários anos, podendo por isso acumular mais facilmente poluentes e não sendo por isso tão rentável para ser explorada comercialmente. Já a salicórnia tem um ciclo de vida anual, germinando por volta de maio e atingindo o pico da colheita em julho para depois largar as sementes e secar em outubro/novembro.
A salicórnia está a ser produzida comercialmente atualmente em antigos tanques das salinas de Aveiro.
Onde encontrar salicórnia no sapal e como deve ser colhida
A salicórnia pode ser encontrada em zonas perturbadas do sapal e a sua colheita deve ser feita com cuidado, porque a planta cede facilmente pela raiz, devendo ser cortada pelo meio com uma tesoura para poder continuar enraizada no solo e desta forma os outros ramos poderem florescer e largar sementes.
Invasora Botão de Latão ou Cotula coronopifolia
Perto da zona onde florescia a salicórnia encontramos a planta invasora Cotula coronopifolia e está adaptada a vários tipos de solo, não suportando sombra nem geada.
Rafael Marques: “As sementes do Botão de Latão são dispersas pela água, o que permite aumentar rapidamente as áreas invadidas com grandes mantos monoespecíficos que impedem o crescimento das espécies nativas, ameaçando assim habitats naturais, felizmente esta invasora ainda não é muito predominante na ria, sendo importante estas visitas para observar o seu progresso e necessidade de intervenção.”
Murraça ou Spartina-maritima – Erva pioneira dos sapais que tolera a salinidade da água
Durante a caminhada o biólogo assinalou a planta murraça ou spartina-marítima, que é outra erva que cresce nos sapais e aguenta a salinidade da água. A murraça é outra planta pioneira na ocupação dos solos em virtude de ter raízes muito fortes do tipo fascicular que se espalham como uma teia, ajudando desta forma a consolidar os terrenos. Os movimentos das marés ajudam a fixar sedimentos que originam progressivamente à formação de ilhotas e assim potenciar que outras plantas se instalem nestes sapais.
Ribeira do Mourão afetada pelas alterações climáticas
Rafael Marques: “A Ribeira do Mourão é caracterizada por ser uma zona típica de sapal alto, com manchas de caniço, misturados com muito junco marítimo e alguma gramata-branca. No entanto, temos aqui um problema relacionado com as alterações climáticas e a subida dos níveis das marés que vão ficando progressivamente mais altas e levando que estes terrenos vão ficando submersos mais tempo.”
Neste ponto este biólogo apontou para uns talos secos numa ilhota, que outrora foram plantas de junco ou caniço e que por estarem muito tempo submersos vão apodrecendo.
Erva-do-Brejo ou Erva-dos-Salgadiços, produz toxinas para se defender
Rafael Marques: “As folhas verdes da Erva-dos-brejos podem conter um licosídeo cianogénico tóxico produzido logo após períodos de seca e sendo particularmente nocivo para os ruminantes. Esta planta, como nasce nas partes mais altas do sapal, desenvolveu estas defesas para se proteger da predação por herbívoros como o gado.”
O fecho da Ria de Aveiro para o mar propiciou um surto de malária em Aveiro
Durante esta visita, Rafael Marques contou alguma da história da Ria de Aveiro. O seu regime de marés é bidiário, 6 horas a subir e outras 6 a descer. A barra de Aveiro, foi construída para a ria ter uma abertura permanente para o mar, já que no passado a mesma ia surgindo de forma aleatória, chegando a ser em Mira, Torreira, Ovar e Esmoriz e havendo períodos em que não existia nenhuma. Esta situação levou a que em tempos as suas águas paradas causassem um surto de malária na cidade de Aveiro.
As primeiras salinas da ria terão sido em Válega - Ovar
As primeiras salinas da ria terão sido em Válega - Ovar aproveitando a proximidade do mar que entrava pela abertura que em tempos houve neste concelho, já que a concentração de sal era maior e propiciava esta indústria. Atualmente como esta zona está muito afastada da barra a concentração do sal é menor, acabando com as salinas desta zona. Atualmente ainda restam algumas de purificação e embalamento no pobre Cais da Ribeira.
As plantas ruderais nascem na berma de caminhos
Rafael Marques: “As plantas ruderais nascem na berma de caminhos, mas muitas vezes nos habitats naturais as estruturas feitas pelo homem introduzem sementes nos terrenos onde são abertos os trilhos para caminhar, nascendo plantas que não são típicas da zona.”
As dosagens das plantas medicinais podem curar ou matar
Rafael Marques: “O livro descreve as propriedades das plantas sendo baseado em bibliografia fidedigna, mas há um aviso importante no começo deste guia, é necessário confirmar sempre as dosagens corretas porque o segredo está na diferença entre a dose de veneno e a dose da cura. Um bocadinho acima faz mal e pode matar, um bocadinho abaixo não faz qualquer efeito.”
A dedaleira trata problemas cardíacos, mas em doses erradas pode matar
Rafael Marques: “A dedaleira é uma planta cor-de-rosa que não passa despercebida pela sua beleza, com umas “maminhas” que os jovens gostam de rebentar na testa. Esta planta é usada para tratamento de problemas de coração, mas pode matar se a dosagem não for a correta.”
A semente da invasora Acácia pode durar 50/80 anos no solo
Rafael Marques: “Uma semente de carvalho no solo pode durar de uma ou duas semanas, uma semente de acácia de 50/80 anos porque tem uma casca muito dura e só germina quando tiver as condições propícias. Nestas ribeiras não é possível elas germinarem porque existe muita vegetação, mas se houvesse um incêndio já era possível porque as plantas nativas eram destruídas pelo fogo, abrindo espaço para as sementes das acácias abrirem com o calor.”
Como destruir as plantas das invasoras Acácias através de um corte na casca
Rafael Marques: “Na BioRia temos andado a fazer o controlo das invasoras, ervas-das-pampas e acácias. Para eliminar as acácias, temos andado a fazer o descasque do seu tronco junto ao pé, cortando uma faixa circular de casca, de modo a que a seiva não circule para as raízes que vão apodrecer e a planta morrer. Se for cortada de outra forma pelas raízes superficiais ela volta a rebentar novos rebentos e dar origem a novas plantas.
Quando a planta é cortada de forma habitual ela sabe que foi atacada e tem que dar descendência, mas se for cortada apenas a casca ela é enganada, tendo uma morte lenta no prazo de seis meses a um ano. No entanto, neste caso morre tudo, primeiro o sistema radicular e por último a planta em cima do solo.”
Erva de São João em honra dos Cavaleiros de Jerusalém
Rafael Marques: “O nome vulgar da Erva de São João foi dado em honra dos Cavaleiros de Jerusalém que a usavam para tratar os soldados feridos no campo de batalha durante as cruzadas. A Erva de São João é usada desde os tempos da Grécia antiga para tratar uma variedade de distúrbios do sistema nervoso e sobretudo para controlar a depressão severa.”
Verbena com muitas propriedades medicinais
Rafael Marques: “Quando estamos a ler as características de uma plantas e encontramos o termo em latim “officinalis”, é sempre para denotar a importância da espécie como planta medicinal. A Verbena tem diversas propriedades medicinais, febrícula, calmante, sedativa, anti-inflamatória e analgésica.”
Cenoura-brava com muitas espécies tóxicas
Rafael Marques: “A cenoura-brava distingue-se das outras plantas porque esta família tem muitas espécies tóxicas."
Erva-doce inflorescência em forma de umbela
Rafael Marques: “Este conjunto de pequenas flores, com uma diferente no meio é uma inflorescência em umbela, que pode ter mais de uma centena de flores.”
As folhas da Erva-lanar parecem serem de lã de ovelha
Biólogo Rafael Marques: “Chama-se Erva-lanar porque ao passarmos a mão na folha parece lã.”
Ribeira do Telhadouro - Pardilhó - Ria de Aveiro
A visita prosseguiu depois para a Ribeira do Telhadouro, em Pardilhó, mas parando pelo caminho para identificar plantas, insetos ou aves.
O sapal, juncal e caniçal possuem uma elevada importância para o equilíbrio do estuário
Rafael Marques: “As zonas húmidas em que estamos correspondem às áreas de sapal, juncal e caniçal possuindo uma elevada importância que deriva do seu caráter multifuncional. Estas zonas são fundamentais na vida e equilíbrio do estuário com importantes funções das transferências de energéticas do ecossistema lagunar.”
Limónio flor ornamental muito bonita
A caminho da Ribeira do Telhadouro Rafael Marques tentou encontrar sem sucesso Limónio, que é uma flor ornamental muito bonita. A razão dessas dificuldades pode estar ligada ao facto de no passado ser muito procurado e colhido pelas floristas. No entanto, o mesmo ainda pode ser encontrado numa destas ribeiras.
Malmequer-dos-sapais da cheirosa flor e mel salgado
Rafael Marques: “O Malmequer-dos-sapais destaca-se das plantas halófitas dos sapais pela exuberância das inflorescências, as suas flores exalam um agradável aroma e os caules e folhas puderem ser comestíveis, como floresce no final do verão, permite em algumas regiões costeiras a produção de um mel ligeiramente salgado.”
Valverde-Esbranquiçado - Suaeda albescens
Rafael Marques: “No Baixo Vouga Lagunar em locais húmidos e salgados como estes, também floresce a espécie “suaeda albescens”, contudo este é uma erva anual geralmente com menos folhas, mas que são mais compridas.”
Erva Cavalinho é muito utilizada em infusões
Rafael Marques: “A Erva cavalinho, equisetum arvense é um feto que não dá flores. No Baixo Vouga Lagunar também é possível observar a espécie equisetum telmateia, sendo utilizadas em infusões por ter propriedades diuréticas.”
Salgueiro árvore de onde se extrai o princípio ativo da aspirina
Durante a caminhada ao passarmos por uma árvore, o Rafael Marques, testou os nossos conhecimentos e perguntou que espécie era. Nós demos uma resposta tímida dizendo e acertando no Salgueiro. No entanto ele acrescentou que esta espécie em particular era o negro.
Biólogo Rafael Marques: “Numa das espécies de salgueiro primo do negro encontraram o ácido salicílico que depois de foi sintetizado no ácido acetilsalicílico, que é a base da aspirina, usada para as dores de cabeça. Na natureza é comum verem os animais como o gado caprino ou as cabras a comer as cascas desta planta, agora se é para elas terem menos dores de cabeça se é porque é bom não sabemos (risos).”
O sabugueiro era muito utilizado para o vinho
Rafael Marques: “O sabugueiro foi considerado desde antiguidade como guardião da saúde. Desta planta utilizam-se as flores, fruto, casca e ramos, pelas suas propriedades terapêuticas para tratar constipações, infeções, inflamações, rouquidão, estômago e afeções da garganta.
O sabugueiro tem um odor intenso e agradável e o “restritivo nigra” refere-se ao gosto dos seus frutos. Isto que vou dizer não tenho a certeza, mas penso que foi o Marquês do Pombal que decretou o abate do sabugueiro porque os produtores de vinho, estavam a fazer a diluição das suas bagas do vinho para render mais.”
Phytolacca americana é também conhecida como Tintureira
Biólogo Rafael Marques: “As bagas da Phytolacca americana eram usadas para tinturaria, para fazer a cor roxa sendo originária da América do Norte. Esta planta foi introduzida como planta ornamental nas regiões temperadas, sendo uma invasora especialmente agressiva nas regiões de clima mediterrâneo. Das suas bagas maduras extraia-se por maceração um corante roxo ou carmim que foi muito valorizado na tinturaria e para realçar cores de vinhos tintos. Os frutos aos quais era retirado as sementes tóxicas eram usados como laxantes."
Inseto besouro listrado
Numa planta em forma de umbela podemos encontrar vários insetos da espécie besouro listrado.
Depois de terminar a visita quisemos saber a opinião do Rafael Marques sobre duas questões:
Durante o seu percurso profissional nos municípios acha que começam a ter mais preocupações pela ecológica e conservação das espécies?
Rafael Marques: “Desde há cinco anos para cá tenho notado uma evolução muito grande, as autarquias têm percebido que têm que se virar para o mundo verde, que significa tratar das florestas e dos espaços naturais, não significa saber que eles existem e fazer apenas percursos, que também é importante para a sensibilização, mas que falta outra parte que é o restauro ecológico. Eu acho que cada vez mais as autarquias estão a perceber que isso é importante e que a população valoriza.
Eu tenho ficado surpreendido com muitos projetos que conheço das autarquias. Acho que há aqui uma mudança de ares, que temos que aproveitar e saber aconselhar e guiar as pessoas que querem fazer este bom caminho.”
Aveiro pertence à região centro onde predomina a monocultura do eucalipto, como é que encara este problema?
Biólogo Rafael Marques: “A monocultura do eucalipto é um assunto bastante complicado principalmente na nossa região, onde domina o minifúndio, que são as pequenas parcelas florestais ou agrícolas. O que acontece muitas das vezes é a impossibilidade de aplicar a lei da boa gestão florestal, porque cada proprietário por vezes é dono de 2000 m2 aqui, 1000 m2 acolá, então temos um grande puzzle que cada pecinha pertence a um dono e quando é assim é muito difícil ter uma exploração florestal rentável porque a área é demasiado pequena.
O que se tornou habitual e o que se tem visto é o abandono das plantações de eucalipto e eles ficarem a crescer sem controlo, por vezes por dez ou quinze anos, sem gastarem na manutenção em vez serem cortados passados oito anos. Porque se formos a fazer as contas todas, um eucaliptal não é muito rentável, mesmo bem gerido. O problema é que o vizinho copia o vizinho e ficamos assim, com um mar, uma monocultura, um deserto verde, como gosto de chamar, que pertence a milhares de proprietários.
Como é que vamos gerir isto? Esta é a grande questão, talvez com a criação de uma associação de produtores onde se consiga juntar todos os terrenos e cada um recebe consoante a área que tenha otimizado para a produção e que valorize e preserve as faixas de produção, a floresta autóctone e linhas de água e desta forma ter realmente uma boa gestão florestal.”
Numa caminhada valorize o caminho: "Temos que olhar para ver e escutar para ouvir"
Nesta pequena caminhada em extensão, mas grandiosa em significado, podemos visitar o microcosmos e valorizar a importância dos sapais e das pequenas vidas da fauna e flora. Nós, que somos amantes da natureza e apaixonados pelos percursos pedestres, constatamos que as pessoas fazem estes caminhos com a vontade de chegar antes de terem partido. Temos que olhar para ver e escutar para ouvir. O mundo natural encerra surpresas em cada minúsculo espaço, temos que estar atentos, por isso não se preocupe com a chegada é a viagem pelo caminho e as maravilhas das pequenas descobertas que contam.
Fim da visita guiada - Agradecimentos
Assim terminou a visita, onde fomos privilegiados por termos tido o Biólogo Rafael Marques a transmitirmos os seus conhecimentos. Agora já podemos olhar para os sapais com olhos mais sapientes e transmitir aos nossos leitores um pouco do que aprendemos.
Agradecemos a ajuda do Rafael Marques e do Município de Estarreja por ter organizado esta visita e só temos pena de não termos podido publicar a reportagem mais cedo.