Manuel "Paciência" | Uma vida à volta das bicicletas

Garagem Paciência em Ovar
Quantos anos tinha quando começou a trabalhar?
Tinha 12 anos. Quando fiz o exame da 4.ª classe, o meu pai, que era serralheiro, perguntou-me para onde é que eu queria ir trabalhar, e eu disse que ia para onde ele quisesse... No princípio, fui trabalhar com ele para a serralharia do Sr. Matos, que ficava à beira do Passo do Encontro. Mais tarde, o nosso patrão abriu um negócio de bicicletas e o meu pai ficou a chefiar aquilo. Quando a casa fechou, abriu o seu próprio negócio.
Então, foi o seu pai que lhe ensinou esta arte. Ainda era vivo quando abriram esta Garagem?
O meu pai faleceu em 1976, no dia 6 de fevereiro, seis anos após termos aberto a Garagem Paciência. Fazia bicicletas pelas mãos dele, os quadros. Mas antes de virmos para aqui, estivemos numa casa arrendada, ali junto ao Passo do Horto. O proprietário da casa quis aumentar a renda e houve uma desavença entre os dois. Foram para Tribunal e deram-nos um prazo para sairmos. Como o meu pai fazia parte da Música Nova, ficou a saber que a Banda queria ficar com este armazém para fazer a sua sede, mas, como lhe ofereceram lá em cima, perto da rotunda, aquele terreno, desistiram de comprar isto. Ficámos nós com esta casa. Pertencia aos Frazões, e tinha sido um armazém de coalhar azeite. Neste sítio, onde estamos a conversar, existia uma fornalha. O meu pai era uma pessoa que tinha muitos conhecimentos, muitas amizades, quer fosse na Ordem Terceira, quer fosse nas Bandas por onde passou.
De onde é que vem o nome Paciência?
Vem de um tio do meu pai, que trabalhava também na serralharia. Chamava-se Manuel de Oliveira Paciência. Como o meu pai trabalhava com ele, o nome Paciência ficou até hoje.
Como é que está o negócio das bicicletas em tempo de crise?
Estamos a atravessar tempos difíceis, mas a bicicleta, como vê, está cada vez mais na moda. E agora, com as ciclovias que estão a fazer por aí, as pessoas utilizam cada vez mais a bicicleta como meio de transporte. Por falar nisso, podiam fazer uma pista do Carregal à Torreira, para que as famílias ao fim de semana pudessem pedalar em segurança para os lados da Ria. Sou casado, tenho dois filhos, um rapaz e uma rapariga, mas, graças a Deus, nunca me faltou trabalho. Todos conhecem o lema desta casa: Hoje não se fia... Amanhã, sim, tenha paciência!

Recebi. A antiga equipa de ciclismo da Ovarense veio convidar-me para ser o mecânico, na altura em que corria o João Gomes e o Joaquim Andrade. Mas como ganhava mais dinheiro na garagem e a responsabilidade era muita, fiquei por aqui. Mas isto também não é fácil, porque temos de saber cativar os clientes e ter mãozinhas para trabalhar.
Lembra-se de alguma figura conhecida que tenha vindo remendar um furo aqui à sua garagem?

O cabo Santos e outros militares da GNR vinham aqui arranjar as suas bicicletas. Quando tinha um furito, aparecia por cá. Era uma pessoa impecável. Tinha um suporte na bicicleta para colocar a espingarda, ao comprido. Tirava-a, e eu arranjava-lhe a bicicleta. Voltava a colocar a espingarda no suporte, e lá ia ele cumprir a sua missão.
As bicicletas também serviam para transportar alguns produtos, não serviam?
Os padeiros tinham um suporte à frente, onde levavam o pão para os fregueses, e os lavradores levavam os canados do leite num suporte que havia atrás nas bicicletas. Os pescadores também iam de bicicleta a tocar o búzio, quando chegava a altura de chamar o gado e os pescadores para a faina no mar...
TEXTO E FOTOS: Fernando Pinto